quinta-feira, 27 de junho de 2013

ANÁLISE SOBRE OS ACONTECIMENTOS NO BRASIL

"Há pessoas que não conseguem perceber o que se passa ao seu redor. Não vêem que não vêem, não sabem que não sabem". Pequeno relato. Zé caiu em um poço e está a 10 metros de profundidade. Olhava para os céus e não viu o buraco. Desesperado, começou a escalar as paredes. Sobe um centímetro e escorrega. Passou o dia fazendo tentativas. As energias começaram a faltar. No dia seguinte, alguém que passava pelo lugar ouviu um barulho. Olhou para o fundo do poço. Enxergou o vulto de Zé. Correu e pegou uma corda. Lançou-a no buraco. Concentrado em seu trabalho, esbaforido, cansado, Zé não ouve o grito da pessoa : "Pegue a corda, pegue a corda". Surdo, sem perceber a realidade, continua a tarefa de escalar, sem sucesso, as paredes. O homem na beira do poço joga uma pedra. Zé sente a dor e olha para cima, irritado, sem compreender nada. Grita furioso :
– O que você quer ? Não vê que estou ocupado ?
O desconhecido se surpreende e volta a aconselhar :
– Aí tem a corda, pegue-a, que eu puxo.
Mais irritado ainda, responde sem olhar para cima :
– Não vê que estou ocupado, ó cara. Não tenho tempo para me preocupar com sua corda.
E recomeça seu trabalho. Parábola : "Zé não vê que não vê, não sabe que não sabe". Os nossos governantes e políticos não perceberam a corda que a galera há tempos joga para que eles possam sair do fundo do poço. Não vêem que não vêem, não sabem que não sabem.
A travessia brasileira
As manifestações que ocorrem no país são diferentes dos eventos ocorridos em décadas passadas, quando se identificavam eixos e discursos centrais (Diretas Já, impeachment de Collor), lideranças e intensa participação da esfera política, por meio de partidos. Distingo três movimentos nos eventos :
1. A canoa atravessa o rio
Um pequeno grupo manobra a canoa no rio para atravessá-lo de um lado para outro. O nome da canoa : MPL – Movimento pelo Passe Livre. Composição dos canoeiros : estudantes. A intenção desejada : reduzir a tarifa de ônibus em SP. A canoa começou a abarrotar de gente. Todos queriam entrar na canoa e chegar à margem oposta.
2. A canoa se transforma em navio
O Movimento pelo Passe Livre, de maneira surpreendente e rápida, assume enorme proporção. A primeira movimentação junta, em torno do grupamento inicial de estudantes, setores variados : ativistas de movimentos em defesa de gêneros, de minorias étnicas e sexuais, funcionários públicos, pais de estudantes, comerciários, punks e anarquistas. A reivindicação básica – redução da tarifa de ônibus – dilui-se na massa discursiva que se ouve e se vê nas palavras de ordem e faixas levantadas pela multidão em passeata :
- contra a corrupção;
- contra a violência;
- contra os serviços precários de saúde;
- contra a deteriorada malha educacional;
- (ao lado de outras bandeiras – como maioridade penal, contra a criminalização do aborto, contra a PEC 37, etc.);
- altos custos dos estádios/dificuldade de acesso a eles.
3. Transatlânticos invadem os mares
A travessia se transforma, de repente, em gigantesca navegação em uma frota de transatlânticos que abrigam milhares de pessoas em mais de 100 capitais e cidades do país. Calcula-se que um milhão de pessoas participou da última manifestação, ocorrida semana passada. A movimentação apresentou algumas características :
- violência da PM no primeiro grande movimento, segunda-feira, dia 17; cenas de vandalismo e depredação de prédios públicos; destruição de carros de empresas jornalísticas;
- hoje, mais de uma semana depois, já chega a quatro mortes (três atropelados e uma gari que morreu de enfarte), além de centenas de feridos em muitas capitais e cidades;
- distanciamento dos grandes partidos políticos. Mesmo os pequenos partidos (de extrema esquerda) foram repelidos pela multidão;
- um discurso difuso – propostas genéricas no entorno da proposta central do MPL : redução de tarifas de ônibus;
- contingentes de classe média foram encorpados por contingentes de jovens da periferia. As massas se fundiram em um grande movimento sem lideranças tradicionais.
Surpresa
As esferas política e governamental foram tomadas de surpresa. Algumas razões estão por trás do susto. Alinho algumas :
- a falsa impressão de que o conforto econômico – mesmo sob ameaça de volta da inflação - apaziguava o país;
- a falsa impressão de que os jovens, descrentes da política, formam grupamentos amorfos, desinteressados e sem motivação para acorrer às ruas;
- a surpresa pela rapidez da formação dos contingentes; pouco se tinha ideia das condições de interatividade e mobilização propiciadas pelas redes eletrônicas da internet;
- a área política encheu-se de indagações : O que dizer ? O que fazer ? Como fazer ?
Gigante não estava adormecido
A ocupação das ruas de grandes e médios centros urbanos por multidões é algo inusitado na feição institucional. Por ocasião das Diretas Já e do Impeachment de Collor, as motivações eram claras e grandes lideranças puxavam as mobilizações. Depois do surto Collor, reaparecem as massas na rua. Ocorre a maior mobilização de toda a nossa história, fato que merece ampla reflexão por emergir como contraponto ao cenário de harmonia que se imaginava, até então. O que significa ? Reflete o fechamento de um ciclo de aceitação/passividade e sinaliza a abertura de um tempo de participação da sociedade, como um todo, no processo decisório.
Democracia direta
Sob certo aspecto, podemos falar da emergência de traços da democracia direta em contraposição à democracia representativa, em crise. O povo percebe que tem a força para fazer mudar as coisas. A redução do preço das passagens de ônibus foi o atestado mais evidente dessa capacidade. Geraldo Alckmin decide suspender também os aumentos do pedágio em SP. Tal percepção do povo funciona como fator de animação/disposição/animus animandi.
PNBIS
Além das causas acima enumeradas, qual o eixo que moveu a ampla movimentação ? Não há um, mas um conjunto de fatores. Podemos inseri-los dentro do que designo de Produto Nacional Bruto da Insatisfação Social (PNBIS), composto por mazelas nas seguintes áreas :
a) Corrupção generalizada;
b) Educação deteriorada;
c) Saúde em estado precário - estruturas inadequadas, ineficientes, obsoletas;
d) Violência em expansão nas médias e grandes cidades;
e) Sistema de mobilidade urbana locupletado;
f) Gastos excessivos em estádios de futebol;
g) Saturação com o modus operandi da velha política. Escândalos e denúncias.
Bolsa-cabeça
Sensação é a de que o ciclo do Bolsa-Barriga (que resulta do Bolsa-Família) está esgotado. Fecha-se. Estudantada de todos os lados quer um Bolsa-Cabeça. Um pacotão para embalar as grandes demandas populares.
Raiva e indignação
Essas áreas compõem a massa de negatividade / insatisfação / indignação que chega, rotineiramente, ao sistema cognitivo do cidadão comum. Para agravar o quadro, os avanços alcançados pela sociedade e a esperança de que o país abra novos capítulos sofrem reveses. (Veja-se, a propósito, a declaração do ministro Dias Toffoli, de que o mensalão poderia durar, ainda, dois anos. Um balde d'água fria na cabeça dos esperançosos brasileiros, que distinguiam o final do maior processo criminal julgado pela mais alta Corte do país).
Exuberância dos estádios
Além disso, os estádios desta Copa das Confederações aquecem fogueiras. Ouçam-se as vaias a Dilma e ao Joseph Blatter no Mané Garrincha, em Brasília, enquanto o MPL já estava nas ruas. A indignação continuou depois, com pancadaria feia entre polícia e manifestantes à frente dos estádios de Fortaleza, de Brasília e BH. A revolta contra a exuberância dos palácios futebolísticos certamente contribuiu para a indignação, sob pano de fundo do contraste com a miséria, falta de saúde, educação, moradia, segurança pública, etc.
Padrão FIFA
"Portugal construiu 10 estádios 'padrão FIFA' para a Eurocopa de 2004. Sete anos depois o país estava falido...10 estádios fatídicos que hoje apodrecem ao sol. A Grécia cometeu iguais loucuras para as Olimpíadas do mesmo ano. Teve a honra de falir primeiro". (João Pereira Coutinho, escritor português, cientista político, FSP, 25/6/2013)
O rastro de pólvora
A mobilização social conta com um formidável aparato comunicativo : as redes sociais. Que funcionam como o rastro de pólvora. Os participantes se comunicam, as palavras de ordem são disparadas e os comandos (quase anônimos) vão somando milhares de seguidores e militantes das causas patrocinadas. A mobilidade dos grupamentos é algo surpreendente, a denotar a existência de um novo ator no desenho da movimentação das massas : a internet.
Sem lideranças e discurso difuso
Chama a atenção a ausência de lideranças tradicionais ou mesmo novas, que tenham visibilidade ou marquem presença na galeria dos comandantes de grandes operações de massa. Essa é outra característica da movimentação social. Os discursos nem sempre são claros, mostrando que a vontade do manifestante de abrir a locução ou ir à rua é o que interessa. Essa situação tende a ser mais visível nas próximas etapas das movimentações, quando novas propostas serão encaminhadas e verbalizadas. O MPL, depois de anunciar que se retira do palco paulistano, por enxergar oportunismo por parte de parcelas e grupos políticos, voltou atrás e promete novas mobilizações.
Clarificação
Sejam quais forem os patrocinadores/mobilizadores, uma séria questão se imporá ao movimento : clarificar metas, objetivos e propostas para que as vozes não caiam no vazio. Na polifonia da Torre de Babel. Os políticos, por sua vez, não são bem vistos nas movimentações, como se viu nas ações de queima e rasgo de bandeiras partidárias. Mas em algum momento, a área política haverá de se fazer presente porque as coisas passam necessariamente pelos governantes do Executivo e pelos parlamentares do Poder Legislativo.
A fala da presidente
A fala da própria presidente Dilma se explica. Tinha de dizer que o país tem governo. Aceita as demandas da massa, mas repele a violência. Afinal, a ordem tem de ser mantida. Mas prometer o que ? Pacotes para a educação ? Quando serão implementados ? Médicos importados ? Convocar governadores e prefeitos para formação de um pacto nacional ? Tudo isso entra na onda verborrágica. A presidente parece perdida. Sob os apelos crescentes do Volta, Lula.
A propósito
Matéria da revista Veja traz importante revelação de que episódio de queima de pneus, em Brasília, teria o patrocínio de forças e quadros do PT, desejosos de por lenha na fogueira. A ABIN, por sua vez, não pescou nada na maré cheia de ondas turbulentas.
MPL : despreparada
Seis representantes do MPL foram convidados para uma conversa com a presidente. Após a conversa, o porta-voz do grupo abriu o verbo : a presidente é uma despreparada para debater e apresentar soluções concretas para a questão dos transportes públicos. Um bumerangue.
A galera
Urge atentar para a composição das galeras e turbas. Por enquanto, a composição dos contingentes nas ruas mostra os seguintes setores : estudantes, participantes de movimentos em defesa de minorias e igualdade de gêneros, pais de estudantes, funcionários públicos, punks, comerciários, anarquistas, desempregados, profissionais liberais, e, depois, incorporação de segmentos jovens das periferias. Estão fora desse circuito as categorias profissionais de trabalhadores, principalmente os setores abrigados nas Centrais Sindicais. A propósito, as Centrais falarão, hoje, com a presidente para apresentar sua pauta de reivindicações. Mas, para surfar na onda, já marcaram greve geral para o dia 11 de julho. Vai pegar ?
Os próximos passos
Para onde o movimento seguirá ? Quais serão os próximos passos ? Quais as bandeiras a serem erguidas nos próximos movimentos ? Algumas trilhas são enxergadas :
- A melhoria da qualidade dos serviços públicos; essa bandeira continuará a ser desfraldada.
- Os problemas relacionados às localidades. A pedra jogada no meio da lagoa tende a chegar às margens. As questões de zonas e regiões da capital e regiões do Estado entrarão nas pautas do movimento.
- Nos Estados e outras capitais, a tendência será a mesma. Dará vazão às demandas específicas de cada comunidade.
- A área política deverá entrar no circuito. As oposições vão buscar motivos para endurecer as críticas.
- O governo Dilma, por sua vez, já se mostra inclinado a arrumar um "Bolsa-Cabeça", alguns programas voltados para agradar aos jovens.
Slogan do momento
"Melhorar a Vida do Povo".
Fechando a coluna
A barafunda quase se instala nesses últimos dias. Fecho a coluna com a polêmica sobre o plebiscito para a Constituinte Exclusiva, no bojo da qual seria feita a Reforma Política.
Plebiscito
No intuito de tomar a dianteira e mostrar serviço, a presidente apresentou um pacotão de 5 pontos para responder ao anseio das galeras. O ponto polêmico foi a proposição para se realizar um plebiscito para ouvir a sociedade sobre uma Constituinte Exclusiva, que realizaria a reforma política. A polêmica se acendeu. Não é possível uma Constituinte para decidir sobre uma especificidade. Ministros do STF, juízes e a OAB se pronunciaram em contrário à ideia da presidente. Que acabou recuando.
A voz do vice presidente
Chamou a atenção o fato de o vice-presidente Michel Temer, um dos mais renomados constitucionalistas do país, não ter sido ouvido preliminarmente sobre a questão. Tivesse ouvido o vice-presidente, Dilma não teria passado pelo dissabor de ouvir as contrariedades à sua ideia. Michel acabou consertando o imbróglio. E deu a solução. Disse à presidente, por ocasião de uma reunião com a OAB, não existir na CF a figura de constituinte exclusiva para tratar de uma questão específica.
A proposta de Michel Temer
Propôs que ela encaminhasse ao Congresso uma mensagem solicitando que o Parlamento convocasse um plebiscito para auscultar o desejo do povo sobre as diversas questões que permeiam a política, do tipo : tipo de voto – distrital, distrital misto, proporcional; fim ou não das coligações proporcionais, coincidência das eleições, etc. Sairia o modelo de interesse da sociedade. A se realizar em agosto. Até 3 de outubro, esse modelo deveria ser aprovado para entrar em vigor já em 2014.
Conselho aos governantes
Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes, membros dos Poderes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado aos políticos e governantes. Pelo momento que o país atravessa, continuaremos a dirigir a eles o conselho :
1. Procurem auscultar as demandas do povo. E passem do discurso à ação.
2. Evitem promessas que não podem ser cumpridas; falas de caráter demagógico.
3. Saibam ler os sinais de um novo tempo. Comunicação governamental ultrapassa a linha do marketing de glorificação. Requer interatividade e compromisso com as comunidades.

FONTE: Porandubas nº 363, site Migalhas.
Link>http://www.migalhas.com.br/Porandubas/35,MI181276,31047-Porandubas+n+363?goback=%2Egde_2672097_member_253360533
 

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Banco deve restituir em dobro valor cobrado indevidamente

Sentença homologada pela 3ª Vara do Juizado Especial Central julgou procedente ação ajuizada por L.D.N.P. da S.M. contra o banco que administra o cartão de crédito da autora, condenado a indenizá-la por danos morais no valor de R$ 2.000,00 e a devolver em dobro o que foi cobrado indevidamente, na quantia de R$ 1.862,28.
De acordo com os autos, a autora narra que fez um acordo com a ré na intenção de quitar totalmente um débito pendente referente ao seu cartão de crédito. Assim, alega que o pagamento seria feito em 13 parcelas no valor de R$ 103,46 cada uma, com início em 21 de setembro de 2011 e término em 21 de setembro de 2012.
A autora relata ainda que realizou normalmente o pagamento das parcelas até o 9º pagamento, pois afirma que na 10ª parcela ocorreu um equívoco e foi pago o valor total da dívida de R$ 1.344,98. Acredita que, por constar na fatura o demonstrativo de pagamento das parcelas anteriores, o valor total da dívida e o valor da parcela a ser quitada, o caixa do banco réu teria se equivocado e cobrado o valor total e não apenas uma parcela.
A autora argumenta que, quando notou o erro, procurou o réu e solicitou que o valor pago indevidamente fosse considerado como pagamento das quatro últimas parcelas do acordo, com a devolução do valor restante de R$ 931,41, mas afirma que tal situação não pode ser resolvida amigavelmente. Assim, narra que, mesmo tendo procurado o Procon, o réu não compareceu, causando-lhe humilhação, pois tentou de todas as formas a devolução do valor pago a mais, porém o réu não mostrou interesse em resolver o problema, mesmo tendo conhecimento de que é uma pessoa idosa, com deficiência física e que necessita da devolução do dinheiro para pagar outros débitos e despesas pessoas de medicamentos para si e seu esposo.
Desse modo, requereu em juízo que o banco réu declare a quitação das parcelas restantes do acordo citado nos autos, restituir em dobro o valor cobrado a maior, de R$ 931,14, e, por fim, ao pagamento de indenização por danos morais.
Em contestação, o réu afirmou que os pagamentos das parcelas foram realizados normalmente até a 9ª parcela e o pagamento da 10º parcela foi feita pela autora por sua livre vontade, sem que houvesse erro do banco. Narra que a operadora do cartão de crédito, ao constatar o equívoco, fez contato com a autora e propôs abater do valor de R$ 1.344,98 o equivalente a 4 parcelas vincendas.
Afirma ainda que, no dia 20 de julho de 2012, o departamento de cobrança solicitou que zerassem o saldo devedor do cartão e que deixassem o mesmo credor no valor de R$ 931,14 para que a autora pudesse pedir o reembolso diretamente na sua agência, sendo orientada pela central de atendimento.
O banco acrescentou que informou a autora que o reembolso seria imediato, sendo apenas necessário a autora ir até uma agência com seus documentos pessoais. Assim, defende que L.D.N. P. da S.M. quer obter vantagens excedentes, pois todas as suas solicitações foram atendidas administrativamente.
De acordo com a sentença, "se a autora não devia o valor cobrado, a ré errou e a prejudicou, fez com que a mesma efetuasse supostamente o pagamento adiantado de parcelas do acordo (sem a concessão de um desconto) e recebeu uma quantia que não era devida pela autora".
Desse modo, analisou a sentença que "encontram-se presentes os requisitos imprescindíveis para a ocorrência da responsabilidade civil, quais sejam: 1) uma ação (comissiva ou omissiva); 2) ocorrência de um dano (moral ou patrimonial); 3) nexo de causalidade entre a ação e o dano, impondo-se o deferimento da pretensão indenizatória".
Quanto ao pedido de devolução em dobro da quantia desembolsada, "o mesmo deve ser julgado procedente. O banco réu cobrou e recebeu da autora uma quantia que não era devida".
Processo nº 0011900-14.2012.8.12.0110

Hora extra entra na base de cálculo de pensão alimentícia

O valor recebido pelo alimentante a título de horas extras, mesmo que não habituais, embora não tenha caráter salarial para efeitos de apuração de outros benefícios trabalhistas, é verba de natureza remuneratória e integra a base de cálculo para a incidência dos alimentos fixados em percentual sobre os rendimentos líquidos. A decisão é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), tomada em sessão realizada nesta terça-feira (25).
Para a maioria dos ministros, o caráter esporádico desse pagamento não é motivo suficiente para afastar sua incidência na pensão. Se assim fosse, de acordo com o ministro Marco Buzzi, que apresentou seu voto-vista na sessão desta terça, também não haveria desconto sobre 13º salário e férias, como ocorre.
Buzzi acompanhou o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão, proferido na sessão do dia 21 de março, quando pediu vista. Naquela mesma data, o ministro Raul Araújo divergiu, entendendo que as horas extras não deveriam compor os alimentos.
Na retomada do julgamento, após o voto-vista de Buzzi, o ministro Antonio Carlos Ferreira também acompanhou o relator. Já a ministra Isabel Gallotti votou com a divergência. Para ela, o acordo de alimentos discutido no recurso não incluiu verbas eventuais como horas extras e participação nos lucros.
Verba remuneratória
No caso julgado, em acordo homologado judicialmente, os alimentos foram fixados em 40% dos rendimentos líquidos do alimentante, até a maioridade do filho, quando o percentual foi reduzido para 30%.
Além dos descontos obrigatórios de Imposto de Renda e contribuição previdenciária, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) excluiu da base de cálculo dos alimentos as verbas indenizatórias e rescisórias, mais as férias indenizadas (não gozadas).
De acordo com a decisão do TJSP, o cálculo da pensão deve incluir 13º salário, horas extras, adicionais de qualquer espécie e o terço constitucional de férias, além de eventual participação nos lucros da empresa. Mas apenas as horas extras foram tratadas no recurso ao STJ.
"De fato, não há dúvida de que os alimentos fixados em percentual sobre os rendimentos do alimentante, de regra, não devem incidir nas verbas de natureza indenizatória", afirmou o ministro Luis Felipe Salomão. Isso porque não geram acréscimo nas possibilidades financeiras do alimentante, pois apenas recompõem alguma perda.
Contudo, o relator destacou que a jurisprudência do STJ já estabeleceu que as horas extras têm caráter remuneratório, inclusive com a incidência de Imposto de Renda.
Eventualidade
O relator destacou ainda ser importante ter em vista que a base legal para a fixação dos alimentos, seus princípios e valores conduzem, invariavelmente, à apreciação do binômio necessidade-possibilidade.
"Por esse raciocínio, pouco importa a eventualidade da percepção da verba, uma vez que, embora de forma sazonal, haverá um acréscimo nas possibilidades alimentares do devedor, hipótese em que, de regra, deverá o alimentado perceber também algum incremento da pensão, mesmo que de forma transitória", entende o relator.
O número deste processo não é divulgado em razão de sigilo judicial.

Ação alega omissão do Congresso por não editar Lei de Defesa do Usuário de Serviços Públicos

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 24) no Supremo Tribunal Federal (STF) para fazer com que o Congresso Nacional elabore a Lei de Defesa do Usuário de Serviços Públicos, prevista no artigo 27 da Emenda Constitucional 19, de 4 de junho de 1998. Quando foi promulgada, a emenda previa que a citada lei fosse editada em 120 dias, mas até hoje deputados e senadores não deliberaram sobre a questão. Para a OAB, está caracterizada a omissão do Congresso em tornar efetiva uma norma constitucional. A entidade pede que o STF declare a mora legislativa e dê prazo ao Congresso para votar a lei.
Segundo a OAB, nesses últimos 14 anos, apesar de terem sido apresentados vários projetos visando regulamentar o artigo 27 da EC 19/1998, nenhuma lei foi elaborada. "E não há falar que a mera existência de projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional impede o conhecimento e a procedência da presente Ação Direta. A demora do Congresso Nacional em regulamentar citada questão não se mostra razoável, principalmente se levarmos em consideração que diversas unidades da Federação já tiveram a oportunidade de legislar sobre a matéria no âmbito de suas competências", argumenta o presidente da entidade, Marcus Vinicius Furtado Coêlho.
A OAB enfatiza a imprescindibilidade da imediata edição de lei ordinária que estabeleça normas de proteção e defesa dos usuários de serviços públicos, tendo em vista que tal tutela foi alçada ao status de preceito constitucional, nos termos do artigo 37, parágrafo 3º, da Constituição Federal. Mais adiante, o artigo 175 da Constituição estabelece que compete ao Poder Público a incumbência de prestar direta ou indiretamente, sob o regime de concessão ou permissão, os serviços públicos, como também estabelecer, mediante lei, os direitos dos usuários. "Logo, a elaboração da lei sub examen é, sem qualquer hesitação, forçosa e imperativa", salienta.
Código de Defesa do Consumidor
A entidade ressalta que, enquanto não é editada a Lei de Defesa do Usuário de Serviços Públicos, o Código de Defesa e Proteção do Consumidor (CDC) tem sido utilizado para suprimir o vácuo legislativo e garantir o mínimo de regulamentação ao usuário de serviços públicos. Na ADO, a entidade cita diversos precedentes de tribunais nos quais se admite a aplicação das disposições do CDC na relação do cidadão com empresas concessionárias de serviços públicos.
A OAB pede liminar para determinar aos presidentes da Câmara e do Senado, bem como à presidência da República, que adotem providências para análise do PL 6.953/2002 (Substitutivo do PL 674/1999) e sua conversão em lei (em no máximo 120 dias) e para determinar a aplicação subsidiária e provisória do CDC enquanto não for editada a Lei de Defesa do Usuário de Serviços Públicos.
O relator da ADO é o ministro Dias Toffoli.
Fonte: LEXMAGISTER

segunda-feira, 24 de junho de 2013

STJ - Dispensa de honorários não é regra em renúncia a ação para aderir a parcelamento tributário

É legal a imposição de honorários advocatícios de sucumbência ao contribuinte que renuncia ao direito ou desiste de ação para aderir ao regime de parcelamento de débitos tributários instituído pela Lei 11.941/09. A decisão é da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de recurso repetitivo.

Seguindo tese firmada pela Corte Especial do STJ, a Seção reafirmou que o artigo 6º, parágrafo 1º, da referida lei “só dispensou dos honorários advocatícios o sujeito passivo que desistir de ação ou renunciar ao direito em demanda na qual se requer o restabelecimento de sua opção ou a sua reinclusão em outros parcelamentos”. 

Segundo o relator do recurso, ministro Herman Benjamin, o dispositivo condiciona a exoneração dos honorários à extinção da ação exatamente na forma do artigo. Nas demais hipóteses, por falta de disposição legal em sentido contrário, aplica-se o artigo 26, caput, do Código de Processo Civil (CPC), que determina o pagamento dos honorários advocatícios pela parte que desistiu da ação. 

Caso julgado

O recurso refere-se a ação declaratória ajuizada contra a União para discutir a existência de créditos de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, constituídos em auto de infração. 

Em primeiro grau, o pedido foi negado e, após apelar ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), o contribuinte apresentou renúncia ao direito discutido na ação para aderir ao regime de parcelamento de tributos. 

Ao homologar a renúncia, o TRF3 extinguiu o processo com julgamento de mérito e fixou os honorários advocatícios, conforme o artigo 20, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil, em R$ 20 mil. Como o recurso foi negado pelo STJ, esses honorários ficam mantidos. 

Processo: REsp 1353826

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

TRT-3ª - Devedor que deixou de nomear bens a execução não pode alegar excesso de penhora

Quando o devedor é citado para cumprir uma obrigação reconhecida em sentença deve cumpri-la em um prazo de 48 horas ou garantir a execução, mediante a nomeação de bens à penhora (artigo 880 da CLT). Esta nomeação de bens à penhora é uma faculdade atribuída ao devedor, que pode escolher e indicar bens que integrem o seu patrimônio e sejam suficientes à satisfação da dívida.

Mas além de um direito, a nomeação de bens à penhora é também um ônus processual, isto é, um encargo do devedor. Por essa razão, caso não exercido dentro do prazo legal, o interessado não poderá mais alegar excesso de penhora. A essa altura, caberá a ele apenas suportar a ação coercitiva do estado incidindo sobre seu patrimônio.

Nessa linha de pensamento, a 4ª Turma do TRT de Minas refutou o argumento da devedora de que o bem penhorado possuía valor extremante superior ao necessário para a satisfação do credor, caracterizando excesso de penhora.

Segundo averiguou o juiz convocado Lucas Vanucci Lins, relator do recurso, a devedora, devidamente citada, não nomeou bens livres e desembaraçados a fim de garantir a execução. Ela sequer indicou outros bens passiveis de penhora ou requereu a substituição dos bens penhorados por depósito em dinheiro. Assim, ponderou o magistrado, ela colocou-se na situação de suportar a compulsoriedade de gravame sobre os bens encontrados pelo oficial de justiça.

O magistrado acrescentou que a executada poderia remir a execução, caso se interessasse em permanecer com o bem constrito (artigo 651/CPC), frisando que, em último caso, o excesso de valor apurado na avaliação dos bens, após a quitação da dívida, seria imediatamente revertido à devedora que, assim, não sofreria prejuízo.

Outro ponto interessante destacado pelo julgador foi que a vedação legal ocorre apenas em relação ao excesso de execução e não ao excesso de penhora, já que, repita-se, nesta última situação, o excedente seria devolvido ao executado após a quitação integral da dívida. Foi apontado, ainda, ser fato notório na Justiça do Trabalho que a importância da avaliação não é alcançada pelos bens levados à hasta pública. E que o imóvel penhorado também garante outras execuções em curso. Esses os motivos os quais, no entender do magistrado, são mais que suficientes para afastar a alegação de excesso de penhora.

Por fim, ele fez menção os princípios da execução: "Cumpre salientar que a penhora efetuada não fere o princípio da menor onerosidade da execução. Bom que se observe que esta se realiza no interesse do credor (artigo 612 do CPC), sendo no mesmo sentido a disposição contida no artigo 685 do CPC, devendo o princípio insculpido no artigo 620 do mesmo diploma legal ser aplicado somente nos casos em que não haja ofensa aos princípios que regem o Processo do Trabalho, sobretudo quanto ao da celeridade na satisfação dos créditos trabalhistas de caráter alimentar", arrematou.

O entendimento foi acompanhado pelos demais julgadores.

Processo: ( 0000531-14.2012.5.03.0081 AP )

Fonte: Tribunal Regional Federal da 3ª Região

Aplicação do artigo 285-A do CPC exige que matéria esteja pacificada nos tribunais



Deve ser afastada a aplicação do artigo 285-A do Código de Processo Civil (CPC) quando o entendimento do juízo de primeiro grau estiver em desconformidade com orientação pacífica de tribunal superior ou do tribunal a que se encontra vinculado.
A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso em que uma instituição financeira pedia que fosse mantida a decisão de primeiro grau que, aplicando o artigo 285-A do CPC, julgou improcedente ação ajuizada por correntista.
O artigo 285-A do CPC é uma técnica de aceleração jurisdicional que prevê a rejeição do pedido como o primeiro ato do juiz no processo. Ela permite o julgamento liminar de improcedência, dispensada a citação do réu, quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em casos idênticos.
Certeza da pacificação
No caso analisado, o correntista ajuizou ação revisional de contrato bancário, para que fosse declarada a nulidade de cláusulas que previam a cobrança de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, capitalização mensal de juros e comissão de permanência. A sentença julgou improcedente o pedido com base no artigo 285-A do CPC, afirmando que seguia o entendimento adotado nos tribunais superiores.
O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) deu provimento à apelação para anular a sentença e determinar o regular prosseguimento da ação. O TJMS considerou que a aplicação do artigo 285-A do CPC está condicionada à certeza de que a questão já se encontra pacificada, tanto no primeiro quanto no segundo grau de jurisdição, devendo ainda a questão versar sobre matéria unicamente de direito.
Da decisão do TJMS, a instituição financeira recorreu ao STJ com o argumento de que, para ser proferida a sentença de improcedência prevista no artigo 285-A, não seria necessário que o entendimento do juiz de primeiro grau estivesse em conformidade com a jurisprudência do tribunal de apelação.
Segundo a relatora no STJ, ministra Nancy Andrighi, o enunciado do artigo 285-A está fundado na ideia de que a improcedência liminar somente é autorizada quando a tese jurídica trazida para julgamento esteja tão amadurecida que torne dispensável sua discussão no processo.
Técnicas de aceleração
A ministra entende que a interpretação do artigo 285-A deve ser feita em conjunto com outros dispositivos do CPC que também se inserem no contexto das técnicas de aceleração da tutela jurisdicional e se apoiam nos precedentes jurisprudenciais. Nesse sentido estão as disposições dos artigos 120, parágrafo único, 518, parágrafo 1º, 527, I, e 557, caput e parágrafo 1ºA, do CPC.
"Note-se que, se o juiz de primeiro grau julga improcedente o pedido e o seu tribunal correspondente julga de forma diversa, mesmo que o tribunal superior siga a mesma linha de entendimento adotada pelo juiz, este não deverá utilizar a técnica de aceleração do processo, posto que, seguramente, o seu tribunal mudará o entendimento e abrirá as portas para a morosidade desnecessária do processo", analisou.
A ministra destacou ainda que é dever do juiz trabalhar com o máximo de cuidado na utilização dos mecanismos de aceleração, sob pena de alcançar efeito contrário ao pretendido pelo legislador.
Na hipótese em julgamento, a ação foi ajuizada em março de 2009 e, com o objetivo de garantir maior celeridade, o que se verificou foi um alongamento de mais de quatro anos no curso do processo. A ministra Nancy Andrighi ressaltou que mais importante do que a quantidade de sentenças de improcedência em casos idênticos é a conformidade delas com a jurisprudência sumulada ou dominante do respectivo tribunal local e dos tribunais superiores.
Fonte: REsp 1225227, STJ

Pela primeira vez, STJ homologa anulação de casamento religioso decretada pelo Vaticano



O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Felix Fischer, homologou sentença eclesiástica de anulação de casamento religioso, confirmada pelo Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica, no Vaticano, com base no que prevê o acordo firmado entre o Brasil e a Santa Sé, relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil (Decreto 7.107/10). 

Este foi o primeiro pedido de homologação de sentença eclesiástica processado nos termos do estatuto. 

O decreto estabelece que as decisões eclesiásticas confirmadas pelo órgão superior de controle da Santa Sé são consideradas sentenças estrangeiras, que têm valor legal no Brasil. Com a decisão do STJ, os ex-cônjuges passaram de casados para solteiros, uma vez que a homologação da sentença eclesiástica resultou também na anulação do casamento em termos civis. 

Isso porque, segundo o artigo 12 do acordo Brasil-Vaticano, o casamento celebrado em conformidade com as leis canônicas, que também atender às exigências estabelecidas pelo direito brasileiro, produzirá efeitos civis. 

Declaração de nulidade

O Código de Direito Canônico, promulgado em 1983, exige que a declaração de nulidade, para ser válida e dar direito a um novo casamento, seja dada por, pelo menos, dois tribunais diferentes. Então, se o primeiro tribunal aprovou a declaração de nulidade, dentro de 20 dias ele é obrigado a encaminhar todo o processo a um segundo tribunal. Depois do tribunal de segunda instância, cabe ao Vaticano confirmar a sentença. 

Inicialmente, o marido pediu a anulação do casamento religioso ao Tribunal Eclesiástico Interdiocesano de Vitória, acusando a mulher de pedofilia. A sentença deferitória foi confirmada pelo Tribunal de Aparecida (SP) e, depois, pelo Vaticano. 

Ao homologar a sentença estrangeira, o ministro Felix Fischer considerou que o pedido não ofende a soberania nacional, a ordem pública nem os bons costumes.

Fonte: Superior Tribunal de Justiça
Autor: Coordenadoria de Editoria e Imprensa