segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

STJ e suas muitas faces


O Superior Tribunal de Justiça (STJ) é formado por 33 ministros. Foi  criado pela Constituição de 1988. Poucos conhecem ou acompanham sua atuação, pois as atenções nacionais estão concentradas no Supremo Tribunal Federal. No site oficial está escrito que é o tribunal da cidadania. Será?
Um simples passeio pelo site permite obter algumas informações preocupantes.
 O tribunal tem 160 veículos, dos quais 112 são automóveis e os
 restantes 48 são vans, furgões e ônibus. 
É difícil entender as razões  de tantos veículos para um simples tribunal. Mais estranho é o número  de funcionários. São 2.741 efetivos. 
 Muitos, é inegável. Mas o número total é maior ainda. Os terceirizados
 representam 1.018. Desta forma, um simples tribunal tem 3.759
funcionários, com a média aproximada de mais de uma centena de trabalhadores por ministro!!  Mesmo assim, em um só contrato, sem  licitação, foram destinados quase R$2 milhões para serviço de secretariado. Não é por falta de recursos que os processos demoram tantos anos para  serem julgados. Dinheiro sobra. Em 2010, a dotação  orçamentária foi de R$940 milhões.
O dinheiro foi mal gasto. Só para comunicação e  divulgação institucional foram reservados R$11 milhões, para  assistência médica a dotação foi de R$47 milhões e mais 45 milhões de auxílio-alimentação.  Os funcionários devem viver com muita sede, pois  foram destinados para compra de água mineral R$170 mil. E para reformar uma cozinha foram gastos R$114 mil.  
Em um acesso digno de  Oswaldo Cruz, o STJ consumiu R$225 mil em vacinas. À conservação dos
 jardins — que, presumo, devem estar muito bem conservados — o tribunal  reservou para um simples sistema de irrigação a módica quantia de  R$286 mil.  
Se o passeio pelos gastos do tribunal é aterrador, muito pior é o  cenário quando analisamos a folha de pagamento.
O STJ fala em transparência, porém não discrimina o nome dos ministros e  funcionários e seus salários. Só é possível saber que um ministro ou  um funcionário (sem o respectivo nome) recebeu em certo mês um determinado salário bruto. E só. Mesmo assim, vale muito a pena  pesquisar as folhas de pagamento, mesmo que nem todas, deste ano,  estejam disponibilizadas. A média salarial é muito alta. Entre   centenas de funcionários efetivos é muito difícil encontrar algum que  ganhe menos de 5 mil reais. Mas o que chama principalmente a atenção, além dos salários, são os  ganhoseventuais, denominação que o tribunal dá para o abono, indenização e antecipação das férias, a antecipação e a gratificação natalinas, pagamentos retroativos e serviço extraordinário e substituição. Ganhos rendosos. Em março deste ano um ministro recebeu, neste item, 169 mil reais. Infelizmente há outros dois que receberam quase que o triplo: um, R$404 mil; e outro, R$435 mil. Este último, somando o salário e as vantagens pessoais, auferiu quase meio milhão de reais em apenas um mês! Os outros dois foram “menos aquinhoados”,  um ficou com R$197 mil e o segundo, com 432 mil. A situação foi muito  mais grave em setembro. Neste mês, seis ministros receberam salários astronômicos: variando de R$190 mil a R$228 mil. Os funcionários (assim como os ministros) acrescem ao salário  (designado, estranhamente, como “remuneração paradigma”) também as “vantagens eventuais”, além das vantagens pessoais e outros auxílios (sem esquecer as diárias). Assim, não é incomum um funcionário receber R$21 mil, como foi o caso do assessor-chefe CJ-3, do ministro 19, os R$25,8 mil do assessor-chefe CJ-3 do ministro 22, ou, ainda, em setembro, o assessor chefe CJ-3 do do desembargador 1 recebeu R$39 mil (seria cômico se não fosse trágico: até parece identificação do seriado “Agente 86”). Certamente o STJ vai argumentar que todos os gastos e privilégios são legais. E devem ser. Mas são imorais, dignos de uma república bufa. Os ministros deveriam ter vergonha de receber 30, 50 ou até 480 mil reais por mês. Na verdade devem achar que é uma intromissão indevida examinar seus gastos. Muitos, inclusive, podem até usar o seu poder legal para coagir os críticos. Triste Judiciário. Depois de tanta luta  para o estabelecimento do estado de direito, acabou confundindo  independência com a gastança irresponsável de recursos públicos, e autonomia com prepotência. Deixou de lado a razão da sua existência: fazer justiça.

Fonte: MARCO ANTONIO VILLA é historiador e professor da Universidade Federal  de São Carlos (SP).

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