segunda-feira, 23 de julho de 2012

Empresas de vistoria veicular vão à Justiça contra os Detrans

A resistência dos departamentos de trânsito (Detrans) de vários Estados e do Distrito Federal em aceitar laudos de vistoria, exigidos para a transferência de propriedade de veículos, levou à Justiça empresas que fornecem o serviço e obrigou o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) a suspender o credenciamento de novos concorrentes. O órgão também determinou em maio a formação de um grupo de trabalho para, em 90 dias, propor soluções de aperfeiçoamento da Resolução nº 282, de 2008, que terceirizou o trabalho, realizado até aquele ano exclusivamente pelos Detrans.
Além de tentar obrigar os departamentos de trânsito a aceitar os laudos de vistoria, empresas buscam na Justiça ressarcimento por prejuízos sofridos. A Quality, de Brasília, protocolou uma ação contra o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) - órgão executor das decisões do Contran - pedindo R$ 5,5 milhões. Criada em 2009, a empresa, de acordo com seu diretor, Guy Machado, foi obrigada a fechar as portas dois anos depois pelo fato de o Departamento de Trânsito do Distrito Federal (Detran-DF) não aceitar laudos por ela emitidos.
A companhia estava regular, com base na Portaria nº 131 do Denatran, que estabelece os requisitos técnicos e procedimentos para credenciamento de prestadoras de serviço de vistoria em veículos. "O Denatran não conseguiu que os Detrans, seguindo a hierarquia federativa, acatassem a legislação", diz Machado, acrescentando que o Contran e o Denatran estão agindo para modernizar a forma como são feitas essas vistorias de transferência, com o objetivo de coibir fraudes.
Há decisões de primeira e segunda instância em vários Estados - como São Paulo, Santa Catarina, Espírito Santo e Minas Gerais - que obrigam os departamentos de trânsito a aceitar laudos de vistoria emitidos por empresas do setor. Os preços cobrados variam de R$ 40 a R$ 90. A Quality, porém, perdeu em segunda instância liminar contra o Detran-DF.
No caso do Distrito Federal, o Denatran e o Ministério das Cidades tentaram fazer o órgão cumprir a Resolução 282. Em setembro de 2010, o Denatran enviou ofício ao departamento de trânsito solicitando o cumprimento da legislação federal. Em março do ano seguinte, foi a vez do então ministro das Cidades, Mário Negromonte, enviar carta ao governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), pedindo que o chefe do executivo brasiliense envidasse "esforços no sentido de determinar que o Detran cumpra as disposições estabelecidas no normativo do Contran".
O objetivo da legislação, segundo o presidente da Associação Nacional das Empresas de Perícias e Vistorias Veiculares (Anpevi), Vagner Caovila, é modernizar tecnicamente as vistorias de transferência, substituindo o tradicional decalque - usado para confirmar a autenticidade das numerações do motor e do chassi do veículo - por um processo ótico considerado à prova de fraude. Os Detrans, afirma Caovila, não têm estrutura suficiente para fazer uma vistoria detalhada dos veículos. Desde que a legislação entrou em vigor, foram criadas cerca de três mil empresas no país para executar o serviço.
Somente no Estado de São Paulo, são feitas cerca de sete mil vistorias por dia. "É impossível para o Detran-SP fazer tudo sozinho", afirma Caovila. Hoje, segundo ele, aproximadamente 5% da frota brasileira circula com "queixa de roubo ou furto". "Se o Denatran não conseguir que a resolução seja cumprida, o caminho natural é a Justiça."
Na ação ajuizada pela brasiliense Quality, pede-se indenização por gastos com equipamentos, instalações e pessoal. Segundo Guy Machado, ao longo do período em que funcionou, a empresa só conseguiu emitir um laudo, cujo valor de R$ 83,50 cobrado teve que ser devolvido porque o Detran-DF não aceitou a vistoria feita.
De acordo com o presidente da Associação Nacional dos Órgãos Executivos de Trânsito dos Estados e do Distrito Federal (AND), Teodoro Moreira Lopes, também presidente do Detran do Mato Grosso, os departamentos de trânsito não são contra modernizar a legislação e nem contra a terceirização das vistorias. "A maioria dos Detrans não é contra [as empresas de vistoria]. É contra o modo como elas foram criadas", diz Lopes, que integra o grupo de trabalho formado pelo Contran. "São os Estados que devem decidir se têm ou não necessidade de recorrer ao auxílio de terceiros para fazer os serviços."
Procurada pelo Valor, a direção do Denatran preferiu não comentar a decisão da empresa Quality de buscar indenização na Justiça. O órgão só deve se pronunciar após a conclusão dos trabalhos de reavaliação da Resolução 282. Ainda de acordo com o Denatran, o grupo de trabalho, instalado no dia 23 de maio, tem o objetivo de apresentar propostas que sirvam para "aprimorar os procedimentos operacionais de credenciamento (das empresas)", o que, a princípio, elimina o temor das empresas de que haja um retrocesso na legislação federal.

Fone: Chico Santos - Do Rio - Valor Econömico, Legislação e Tribuntos

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