sexta-feira, 2 de maio de 2014

Sequestro internacional de crianças: realidade e inovações judiciárias para solução dos casos

O Brasil tem 171 casos de sequestro internacional de crianças para retorno ao país de residência habitual, em 95% dos casos, quem subtrai a criança do estrangeiro é a mãe e, em praticamente todos, a mulher é da comunidade brasileira no exterior e decide retornar ao Brasil com o filho de forma irregular. Em 80% das vezes, a principal alegação para o final do relacionamento com o pai estrangeiro e a volta ao país é a violência doméstica. 

Esse foi o cenário traçado pelo coordenador-geral da Autoridade Central Administrativa Federal, George Lima, no Curso sobre Sequestro Internacional de Criança, promovido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). O evento terminou ontem (29/4), na Justiça Federal, em Florianópolis. 

Lima é responsável pelo órgão da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, onde chegam os pedidos de cooperação jurídica internacional para fazer valer as convenções assinadas pelo Brasil sobre subtração e adoção internacional de crianças e adolescentes. 

“Está sob nossa responsabilidade a proteção desta criança”, afirmou Lima ao divulgar que Portugal é o país com maior número de pedidos de devolução de crianças (35), seguido pela Itália (21), Estados Unidos (19), Espanha (14) e França (12). 

Grupo de Haia 

Já o desembargador federal do TRF4 Jorge Antônio Maurique abordou o papel do Judiciário na aplicação da Convenção de Haia, na resolução das ações de subtração ou retenção ilícita de menor em país diferente daquele em que mora habitualmente. 

“Antes de Haia vigorar e ser aplicada no país, quando havia um sequestro, a solução era o outro genitor ir ao exterior e sequestrar a criança novamente, sem a mínima civilidade”, contou Maurique. O magistrado explicou que, a partir de 2006, o Supremo Tribunal Federal (STF), na administração da então presidente Ellen Northfleet, criou o chamado “Grupo de Haia”, do qual era coordenador. 

O grupo reunia representantes do Judiciário Federal, da Advocacia Geral da União (AGU), da Presidência da República, do STF, do Ministério das Relações Exteriores e da Autoridade Central, para tornar efetiva a Convenção que começou a vigorar no Brasil em 2000. 

“Havia a necessidade de trabalharmos para realmente aplicar a convenção de Haia, porque já existiam problemas diplomáticos e denúncias contra o Brasil perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos e, também, na Corte de Haia, por descumprimento”, lembrou o desembargador. 

Como um dos tantos resultados práticos do trabalho do grupo, Maurique ressaltou a participação do Brasil na Reunião de Especialistas de Haia, onde foi representante. Ele destacou a apresentação de moções que foram adotadas na convenção. “Fizemos a sugestão de afastar o aspecto criminal do sequestro, presente em muitos ordenamentos jurídicos de países signatários, para incentivar o retorno voluntário da criança ao país de residência habitual”, completou. 

Juiz de ligação internacional 

Ao final dos estudos, o grupo apresentou ao STF um anteprojeto no qual, entre outras questões, foi consolidado o entendimento da competência da Justiça Federal para os casos de sequestro internacional de menores, o papel da União nas ações e a determinação dos prazos de cumprimento. 

Jorge Antônio Maurique também relatou a experiência de ter sido juiz federal de ligação entre Haia/Brasil, atuando como facilitador nas questões de cooperação jurídica internacional. “São cerca de 80 juízes de ligação no mundo todo, dois no Brasil, que tem como principal objetivo esclarecer os juízes locais sobre a matéria e explicar a aplicação da convenção nestes casos tão dramáticos, onde as crianças são vítimas da guerra dos pais”. 

O magistrado aponta como próximos passos importantes para a efetividade da convenção no país a especialização de juízes para atuação nos casos e a integração judiciária para “garantir mais inserção do Brasil na comunidade internacional”, disse Maurique. 

“A convenção quer superar o mar que separa o Brasil da Europa e dos Estados Unidos. Se queremos nossas crianças que foram levadas ilegalmente para fora de volta, temos que ter reciprocidade, diplomacia judiciária e boa fé para devolver ao país de origem aquelas que aqui estão ilicitamente”, concluiu o desembargador do TRF4.

Fonte: TRF 4 via Clipping AASP

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