segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Patrimoniais: O Planejamento Sucessório e a Ilusão Tributária

O caminho para a definição de planejamento sucessório inicia-se por dizer o que ele não é. Planejamento sucessório não é planejamento matrimonial, nem tampoucoplanejamento tributário. Ou seja, não é instrumento para resolver problemas matrimoniais, conflitos entre marido e mulher. E também, não é, embora possa tangenciar, mecanismo para pagar menos tributos. De modo direto, pode-se dizer que Planejamento Sucessório é o conjunto de ações jurídicas lícitas, voltadas para a transmissão do patrimônio de uma pessoa natural aos seus sucessores, em vida ou post mortem, seja por meios contratuais, seja por via de inventário (judicial ou administrativo).
As finalidades do planejamento sucessório podem ser resumidas em: 1 - Evitar o inventário; e 2 - Não sendo possível evitá-lo, tornar o processo de transmissão menos traumático do ponto de vista temporal e patrimonial (considerando-se aí, os aspectos pertinentes aos custos de sua efetivação).
O que move o planejamento sucessório? Antes de tudo a vontade do titular do patrimônio (autor da herança), mas também deve ser levado em conta o interesse dos sucessores. Claro que, para muitos, a herança recebida em vida gera uma situação de conforto sócio-patrimonial.
Sabe-se, contudo, que muitas pessoas constituíram sociedades civis de participações, as chamadas “patrimoniais”, entendendo que a sua mera constituição, através da integralização do capital por meio da transferência de bens imóveis, é suficiente para “matar dois (às vezes três) coelhos com uma só cajadada”. Assim, muitos pensam que ao estabelecer uma empresa “patrimonial” vão conseguir, simultaneamente, um meio de pagar menos impostos, uma forma de evitar os conflitos entre os futuros herdeiros e às vezes, de maneira maliciosa um mecanismo para fraudar direitos de meação do cônjuge ou companheiro, ou ainda de um filho havido fora do casamento.
No que diz respeito, aos conflitos entre os futuros herdeiros, o que se verifica, na maior parte das vezes, é que a constituição da “patrimonial” tende a transformar o conflito, que era meramente sucessório, em conflito societário. Agrava-se tal lide, se o planejamento for concebido com a intenção de prejudicar direitos, seja de cônjuge/companheiro, seja de filhos não reconhecidos (ou se reconhecidos, que não sejam contemplados dentro dos padrões previstos na legislação).
Desde a perspectiva tributária, o problema se encontra na equivocada percepção, largamente disseminada inclusive, o que é surpreendente, entre profissionais da área, de que a exploração econômica do patrimônio pela sociedade patrimonial é invariavelmente menos onerosa do que a exploração do mesmo patrimônio realizada pelo seu titular pessoa física.
O que se costuma considerar para cometer tal equívoco é a confrontação entre as alíquotas marginais do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF), da ordem de 27,5%, e do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ), da ordem de 15%. A fragilidade de tal simulação não resiste a uma análise mais detida. É necessário considerar que, embora o IRPJ seja, isoladamente, menos oneroso do que o IRPF, as empresas submetem-se a um universo maior, tanto de tributos, como de deveres formais de natureza tributária, fiscal, contábil, empresarial, trabalhista e previdenciária.
Além do IRPJ, está-se submetido à CSLL, Cofins, PIS, contribuição previdenciária patronal e do trabalhador, além de taxas específicas cobradas apenas destes sujeitos, o que inclui desde de taxas de fiscalização de funcionamento, até alvarás diversos e taxas de cartorárias e Junta Comercial. As empresas, ao contrário do que ocorre com as pessoas físicas, terminam por ser obrigadas à contratação de uma estrutura contábil, devido à complexidade do sistema aplicável às empresas, e que por mais simples que se mostre aquela estrutura contábil termina por também onerar o contribuinte.
A depender, por exemplo, do montante de patrimônio considerado, ou do rendimento dele decorrente, é possível que uma sociedade patrimonial termine por onerar de forma desnecessária uma exploração econômica que se viesse a ser realizada pelo proprietário pessoa física simplesmente não geraria tributo a pagar, devido ao regime de isenção eventualmente aplicável em matéria de IRPF.
Estas observações não devem ser consideradas como uma determinação categórica da não utilização das sociedades patrimoniais, o que significaria incidir no extremo oposto ao erro que aqui se pretende prevenir. Em realidade, o alerta deve ser entendido como um convite à ponderação de todas as variáveis, civis e tributárias, a serem consideradas pelo proprietário-investidor-contribuinte no momento da tomada de decisão.
Em definitiva, é imprescindível ter presente que o universo de instrumentos jurídicos disponibilizados pelo Direito brasileiro é amplo o suficiente para dissuadir qualquer tomada de decisão pautada tão somente num paralelismo entre duas hipóteses possíveis. Em realidade, é necessário estar munido do volume de informações suficiente para viabilizar uma correta e justificável deste que aliás é excelente instrumento de planejamento sucessório e tributário.

Camilo Colani[1]
André Portella[2]

[1] Mestre e Doutor em Direito Civil, pela PUC/SP; Professor da PUC/SP, da FSBA, da Faculdade Baiana de Direito, da Unijorge, do programa de mestrado e doutorado da UCSal. Advogado e consultor em Direito Civil, com ênfase em Direito de Família e das Sucessões.
[2] Mestre e Doutor em Direito Financeiro e Tributário pela Universidad Complutense de Madrid, menção honrosa Doctors Europeus; Professor da UFBA, UNEB e UCSal, junto aos cursos de Graduação em Direito eMestrados, e Coordenador da Especialização em Direito Tributário daUCSal; Consultor Jurídico parlamentar para assuntos de FinançasPúblicas e Tributação; Advogado e Consultor Tributário de empresas, cooperativas e Municípios no Estado da Bahia; Coordenador do NEF – Núcleo deEstudos em Tributação e Finanças Públicas; Ex-Conselheiro do Conselho deContribuintes do Município de Salvador; Ex-chefe do Gabinete da Procuradoria Jurídica da AssembleiaLegislativa do Estado da Bahia; Ex-Assessor de Desembargador do Tribunal deJustiça do Estado da Bahia; Pesquisador CNPq/FAPESB.
Camilo Colani
Bacharel, mestre e doutor pela PUC/SP; advogado desde 1992; Professor de direito civil na PUC/SP (licenciado), na Ucsal (Universidade Católica do Salvador) (graduação, pós graduação "lato sensu" e no programa de mestrado e doutorado em Família), na Faculdade Baiana de Direito 

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