Por maioria de votos, vencido o presidente, ministro Cezar Peluso ,
o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou procedente, na
sessão de quinta-feira (09), a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI
4424) ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), que defende
ser a violência contra mulheres não uma questão privada, mas sim
merecedora de ação penal pública.
A corrente majoritária da Corte acompanhou o voto do relator, ministro Março Aurélio Mello , sobre a possibilidade de o Ministério Público dar início à ação penal sem necessidade de representação da vítima.
Como amicus curiae da causa, o presidente nacional da ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante ,
fez sustentação em apoio à tese da constitucionalidade da durante a
sessão. Ele defendeu a necessidade da proteção do Estado à mulher como
parte biológica e socialmente mais frágil dentro do lar e da sociedade.
"Homens e mulheres são iguais, mas a grande realidade hoje é a que
biologicamente e socialmente a mulher ainda é inferior e, em
consequência, vítima de agressões, necessitando a proteção do Estado",
afirmou o presidente da OAB..
Ophir citou dados estatísticos do Conselho Nacional de Justiça,
obervando que "a continuar esse tipo de violência doméstica familiar
contra a mulher que eles expressam, poderemos chegar a uma verdadeira
guerra civil dentro do lar; é necessário que a lei liberte, a lei vem
para libertar a mulher dessa situação". Conforme os dados apresentados,
desde a sanção da , até março do ano passado, foram distribuídos 331.796
processos por agressões a mulheres em todo o Brasil. Destes, foram
sentenciados 110.998 processos; e designadas 20.999 audiências. O CNJ
registrou um total de 9.715 prisões em flagrante decretadas e 1.577
prisões preventivas, dentro da referida legislação.
O artigo 16 da lei dispõe que as ações penais públicas "são
condicionadas à representação da ofendida", mas para a maioria dos
ministros do STF essa circunstância acaba por esvaziar a proteção
constitucional assegurada às mulheres. Também foi esclarecido que não
compete aos Juizados Especiais julgar os crimes cometidos no âmbito da .
O relator do processo, ministro Março Aurélio, disse que baseou seu
voto no "princípio da realidade". "Precisamos levar em conta o que
ocorre no dia a dia quanto à violência doméstica", afirmou.
Ele alegou que 90% das mulheres agredidas acabam desistindo da ação
quando têm que comparecer à Justiça para a chamada "audiência de
confirmação", na qual expressam a vontade em processar o agressor --o
próprio marido, companheiro ou ex.
Ricardo Lewandowski chamou atenção para aspectos em torno do fenômeno
conhecido como "vício da vontade" e salientou a importância de se
permitir a abertura da ação penal independentemente de a vítima prestar
queixa. "Penso que nós estamos diante de um fenômeno psicológico e
jurídico, que os juristas denominam de vício da vontade, e que é
conhecido e estudado desde os antigos romanos. As mulheres, como está
demonstrado estatisticamente, não representam criminalmente contra o
companheiro ou marido, em razão da permanente coação moral e física que
sofrem e que inibe a sua livre manifestação da vontade", finalizou.
O presidente do STF, ministro Cezar Peluso, único a divergir do
relator, advertiu os riscos que a decisão de tal plenária pode causar na
sociedade brasileira, tendo em vista não ser somente a doutrina
jurídica que se encontra dividida quanto ao alcance da Lei. Citando
estudos de várias associações da sociedade civil e também do IPEA, o
presidente apontou as conclusões acerca de uma eventual conveniência de
se permitir que os crimes cometidos no âmbito da lei sejam processados e
julgados pelos Juizados Especiais, em razão de sua maior celeridade
"Sabemos que a celeridade é um dos ingredientes importantes no
combate à violência, isto é, quanto mais rápida for a decisão da causa,
maior será sua eficácia. Além disso, a oralidade ínsita aos Juizados
Especiais é outro fator importantíssimo porque essa violência se
manifesta no seio da entidade familiar. Fui juiz de Família por oito
anos e sei muito bem como essas pessoas interagem na presença do
magistrado. Vemos que há vários aspectos que deveriam ser considerados
para a solução de um problema de grande complexidade como este",
salientou
Quanto ao entendimento majoritário que permitirá o início da ação
penal mesmo que a vítima não tenha a iniciativa de denunciar o
companheiro-agressor, o ministro Peluso advertiu que, se o caráter
condicionado da ação foi inserido na lei, houve motivos justificados
para isso. "Não posso supor que o legislador tenha sido leviano ao
estabelecer o caráter condicionado da ação penal. Ele deve ter levado em
consideração, com certeza, elementos trazidos por pessoas da área da
sociologia e das relações humanas, inclusive por meio de audiências
públicas, que apresentaram dados capazes de justificar essa concepção da
ação penal", disse
Ao analisar os efeitos práticos da decisão, o presidente do STF
afirmou que é preciso respeitar o direito das mulheres que optam por não
apresentar queixas contra seus companheiros quando sofrem algum tipo de
agressão. "Isso significa o exercício do núcleo substancial da
dignidade da pessoa humana, que é a responsabilidade do ser humano pelo
seu destino. O cidadão é o sujeito de sua história, é dele a capacidade
de se decidir por um caminho, e isso me parece que transpareceu nessa
norma agora contestada", salientou. O ministro citou como exemplo a
circunstância em que a ação penal tenha se iniciado e o casal, depois de
feitas as pazes, seja surpreendido por uma condenação penal.
Em mutirões realizados no final do mês de janeiro, Visitas de
parlamentares a quatro estados mostraram que atendimento a mulheres
vítimas de violência melhorou e número de denúncias cresceu.
Dados da Secretaria de Políticas para as Mulheres mostram que o
número de atendimentos cresceu desde a entrada em vigor da lei. Em 2007,
quando o sistema foi adaptado para receber informações sobre a , a
Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180) registrou 438.587
atendimentos. Entre janeiro e outubro do ano passado (últimos dados
disponíveis), o sistema já havia recebido 530.542 ligações.
O número de serviços especializados no atendimento à mulher, como
delegacias e juizados, também aumentou. No ano passado, o País tinha 928
serviços, contra os 521 existentes em 2006 - um crescimento de 78,1%.
Em quatro anos, 9.715 pessoas foram presas em flagrante com base na .
O balanço considerou processos distribuídos em varas e juizados
especializados no tema desde a entrada em vigor da lei (agosto de 2006)
até julho de 2010.
O impacto da lei no dia a dia das mulheres também é considerado positivo. Sondagem de opinião realizada pela Câmara no ano passado constatou que a é aprovada por 95,5% dos entrevistados.
Falta de estrutura
"A lei foi um grande avanço, mas ainda falta estrutura para atender a
demanda de assistência", avalia a deputada Flávia Morais (PDT-GO),
procuradora-adjunta da Mulher, que participou do Mutirão da Penha em São
Paulo e em Goiás. Em São Paulo, segundo ela, não existe uma secretaria
estadual de políticas para as mulheres, órgão que seria responsável pela
articulação de todas as ações no setor. Já em Goiás, a secretaria
existe, mas faltam delegacias especializadas e juizados.
Flávia argumenta que existem muitos projetos em andamento, mas
implantados de forma isolada, sem integração. O resultado é que, às
vezes, o Ministério Público tem um núcleo de combate à violência
doméstica, mas o estado não constrói casas-abrigo. "A lei também fala em
juizados contra a violência, mas não só eles são importantes. O
agressor, por exemplo, precisa de tratamento para não fazer mais
vítimas", observa a deputada goiana.
Além de São Paulo e de Goiás, o Mutirão da Penha visitou em 2011, o
Pará e o Distrito Federal. Em cada unidade da Federação, as deputadas
reúnem-se com representantes do governo local, dos tribunais de Justiça,
do Ministério Público e das assembleias legislativas.
Articulação
A procuradora da Mulher, deputada Elcione Barbalho (PMDB-PA),
responsável pela organização do Mutirão da Penha, ressalta a importância
de ações articuladas no combate a violência contra a mulher. Ela
explica que o trabalho da Procuradoria restrito à Câmara seria
insuficiente para consolidar as ações necessárias para a aplicação
efetiva da lei. "Desta forma, surgiu a ideia de percorrer os estados",
afirma, ressaltando os resultados positivos desta fase inicial das
visitas.
"Nos estados, as autoridades locais querem alguém que movimente e
ajude na articulação. É uma forma de chamar a atenção da mídia e dos
gestores para a causa", complementa Flávia Morais. Ela acredita que
novos avanços, no entanto, dependem de mais orçamento e da eleição de
mais mulheres para o Parlamento.
Fonte: ' Agência Câmara de Notícias ', STF e Conjur
Meu comentário: Acho um retrocesso a OAB dizer que a mulher é "sexo frágil", afinal estamos na luta há séculos para sermos tratadas com igualdade e o Estado e a Sociedade ainda querem nos "proteger de forma diferenciada". Todo o agressor (seja homem ou mulher) tem que ser punido, independente de seu sexo, todo cidadão tem direito a defesa, a proteção do Estado, independente de seu sexo.
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