A Justiça Federal em Santarém (PA)
determinou que a Receita Federal libere bens arrolados de um
contribuinte que somam R$ 1,2 milhão. O arrolamento é a indicação de
bens dados em garantia nas discussões de débitos ficais, e que podem vir
a ser penhorados pelo Fisco. A liminar foi concedida depois de o
governo elevar de R$ 500 mil para R$ 2 milhões o valor mínimo de débitos
fiscais sujeitos ao arrolamento.
A partir da mudança, contribuintes com bens dados em garantia, mas
que discutem autuações inferiores ao novo limite, têm solicitado o
cancelamento dos arrolamentos ao Fisco. Foi o caso do empresário
paraense que possui imóveis e veículos bloqueados há quatro anos para
discutir uma cobrança do Imposto de Renda (IR) referente ao período de
2003 e 2005. O contribuinte entrou na Justiça depois de ter seu pedido
negado pela Delegacia da Receita em Santarém.
Na ação, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) sustenta
que o artigo 17 da Instrução Normativa (IN) nº 1.171, de 7 de julho,
proíbe a aplicação do novo limite aos arrolamentos efetuados antes de 30
de setembro, quando a mudança entrou em vigor.
Entretanto, o juiz José Airton de Aguiar Portela, da 1º Vara Federal
de Santarém, aceitou o argumento do contribuinte de que o artigo 106 do
Código Tributário Nacional (CTN) autoriza a aplicação de normas mais
benéficas para fatos passados. Para o magistrado, o CTN deve se sobrepor
à norma editada pela Receita. "Não soa razoável aceitar que um
dispositivo normativo concebido para disciplinar a atuação de
determinado órgão estatal derrogue a própria lei, único instrumento
legitimado a criar, manter ou derrogar direitos", diz o magistrado na
decisão.
Para o advogado do contribuinte, Márcio Maués, sócio do Silveira,
Athias, Soriano de Mello, Guimarães, Pinheiro & Scaff, não existe
motivo para o novo limite ser aplicado para todos os arrolamentos
inferiores a R$ 2 milhões. "Os arrolamentos prejudicam o contribuinte,
há obstáculos e burocracias para vender bens dados em garantia", diz.
Segundo advogados, o precedente - primeiro que se tem notícia - é
importante e a tese do contribuinte tem chance de prosperar. Isso
porque, além do CTN, o artigo 6º da Lei de Introdução às normas do
Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4657, de 1942) prevê que as leis
tenham efeito "imediato e geral", exceto se violar "ato jurídico
perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada". Para o tributarista
Ricardo Martins Rodrigues, do Cascione, Pulino, Boulos & Santos, o
Fisco poderia liberar os bens sem violar a garantia já formalizada. "Não
faria sentido manter o arrolamento anterior de valor inferior. O Fisco
não teria prejuízo", afirma.
Para Magali Chalela, do Loddi & Ramires Advogados, a liminar tem
tudo para ser confirmada em sentença e ser aplicada em casos
semelhantes. "É o típico caso de instruções normativas que ampliam ou
restringem as previsões em lei", diz. A advogada acrescenta que a Lei nº
9.532, de 1997, autoriza que o Executivo aumente o limite da dívida
para arrolamento, mas não restringe o direito do contribuinte.
A Receita, entretanto, afirma que continuará negando os pedidos. A
interpretação do Fisco é de que o artigo 106 do CTN não se aplica aos
casos de arrolamento, mas apenas às penalidades. "Não há previsão legal
para cancelar o arrolamento. Se o crédito [tributário] existe, a
garantia deve ser mantida", afirma Ellis Regina Leite, auditora fiscal e
chefe da Divisão de Cobrança de Créditos Tributários em Processos da
Receita.
A elevação do limite foi determinada pelo Decreto nº 7.573, de 30 de
setembro de 2011. O dispositivo manteve a regra que estabelece que o
valor da autuação deve corresponder a pelo menos 30% do patrimônio da
empresa. Na ocasião, a Receita justificou que o valor estava defasado e
que o volume de processos de indicação de bens tem sobrecarregado os
cartórios. Ainda segundo o Fisco, o objetivo da mudança é agilizar as
autuações fiscais.
Bárbara Pombo - De São Paulo
Fonte: VAlor Econômico, Clipping AASP, 23/04/2012.
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