Após a morte de uma pessoa, os bens, em
tese, já são dos herdeiros. Mas, para a transmissão oficial, existe uma
enorme burocracia. Nos casos mais complicados, o processo pode levar até
quatro anos.
Há dois caminhos. O mais simples é o inventário extrajudicial, que
dura de 3 a 6 meses e pode ser feito no cartório ou no escritório do
advogado. Contudo, só é possível se não existir testamento, se todos os
herdeiros estiverem de acordo, se não houver crianças nem pessoas
consideradas incapazes na divisão do bolo e se a pessoa que morreu não
tiver dívida tributária. Ou seja, algo muito difícil de ocorrer.
A segunda opção é a mais provável para a maioria das pessoas.
Trata-se do inventário judicial que, mesmo sem litígio, leva de um a
quatro anos, dependendo do grau de complicação.
O advogado Luiz Kignel lembra que, muitas vezes, a burocracia é
usada por herdeiros interessados em prolongar o inventário. 'Isso
acontece muito. Entre uma petição e outra, o processo se arrasta por
muitos anos.'
Apesar da diferença de prazos e procedimentos, a documentação
exigida nos dois tipos de processos é idêntica - e burocrática. O
primeiro passo é reunir os documentos dos herdeiros, que provem o
vínculo com o falecido: certidão de casamento, de nascimento, CPF, pacto
nupcial.
Depois é preciso reunir também a documentação do patrimônio. 'E aí é
que as coisas costumam se complicar, porque é muito comum encontrar
irregularidades', diz o advogado.
Os imóveis precisam ter matrícula atualizada e carnê do IPTU. No
caso das empresas, é necessário apresentar o contrato social com a
última alteração. Para a partilha das aplicações financeiras, é preciso
um extrato com a data do falecimento.
No caso dos imóveis, a burocracia cresce muito quando a documentação
está irregular ou inexiste. Impostos atrasados também devem ser pagos.
A burocracia na transmissão de herança pode ser ainda maior quando o
patrimônio é composto por uma ou mais empresas. 'Muitas vezes os
herdeiros querem receber suas cotas por valor de mercado. Aí a empresa
precisa ser avaliada por um perito. Esse procedimento atrasa e encarece o
processo', diz a advogada Márcia Setti Phebo.
Eliminar a burocracia em um processo de transmissão de herança é
impossível, mas muita dor de cabeça pode ser evitada com um planejamento
cuidadoso, em vida. 'Planejar a transmissão da herança é uma atitude
inteligente', alerta a advogada. Ela recomenda que as famílias procurem
orientação de um advogado, para que os herdeiros conheçam seus direitos e
se entendam com mais facilidade.
'Foi muito difícil na época. A lentidão da Justiça é inaceitável'
Em 1992, a morte de um empresário em Minas Gerais marcou o início de
uma longa e desgastante espera familiar, agravada por questões
burocráticas. Um testamento, feito quando o empresário já estava
bastante doente, determinava como seria a divisão da herança deixada
para a esposa e os nove filhos.
Parte dos herdeiros, no entanto, não concordou com o laudo oficial,
que determinava o valor do patrimônio, formado por uma distribuidora de
produtos alimentícios, uma fazenda e imóveis. Foi contratado, então, um
segundo perito, que encontrou muitas barreiras nas várias tentativas
feitas para determinar o valor da empresa.
"Cada petição demorava meses para ser analisada pelo juiz. Entre
idas e vindas, o processo foi se arrastando, enquanto parte da família
enfrentava dificuldades financeiras", lembra Maria do Carmo Silveira
Gomide, a oitava filha, que na época tinha três filhos pequenos para
sustentar e precisava do dinheiro da herança para abrir um negócio.
"Essa foi a pior fase da minha vida. O acompanhamento de todo o
processo burocrático, que era extremamente lento, atrapalhou demais a
minha rotina com meu marido e meus filhos."
Com tantos entraves, o inventário só foi concluído em 1995, após um
acordo familiar. Maria do Carmo se mudou para São Paulo e abriu um
empório de comida mineira, na Granja Vianna. "Foi muito difícil na
época. A lentidão da Justiça é inaceitável."
VGBL. Quem tem um patrimônio e quer facilitar a vida dos herdeiros
pode tomar algumas medidas. Uma delas é garantir que a família tenha
acesso a uma quantia suficiente para se manter até a conclusão do
inventário. Isso pode ser feito por meio de fundos de previdência
privada do tipo VGBL (Vida Gerador de Benefícios Livres), que permitem
ao segurado eleger um ou mais beneficiários em caso de morte.
A vantagem é que o saldo é transferido ao beneficiário sem passar
pelo inventário e sem pagar o Imposto de Transmissão Causa Mortis e
Doação. Incide somente Imposto de Renda.
LETÍCIA BRAGAGLIA
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