quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Mestres e doutores em falta no mercado

A greve dos professores no país reacendeu o debate sobre a qualificação profissional e trouxe à tona a discussão de projeto de lei aprovado no Senado Federal, no último dia 12, que aumenta a exigência nas universidades do percentual mínimo de mestres e doutores no corpo docente de um terço para 50%. Durante a paralisação, que deixou 56 das 59 universidades federais por quase quatro meses sem aulas, uma das principais divergências das negociações foi a valorização dos profissionais com mais titulação perante os que têm mais tempo de carreira. Na proposta do Ministério da Educação, a pasta garantiu que daria prioridade à qualidade acadêmica e aos profissionais com dedicação exclusiva.

Para especialistas, embora a medida aprovada no Senado só tenha validade entre as universidades, a quantidade atual de mestres e doutores no país não é suficiente para atender a demanda, especialmente se consideradas as demais instituições de ensino superior. A matéria ainda será analisada pela Câmara dos Deputados, antes de ir à sanção presidencial.

Professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), Ocimar Alavarse explica que hoje o país não teria condições de se adequar a norma, mas acredita que, na época em que a medida entrar em vigor, o país estará apto à atender a lei. Segundo ele, os cursos de pós-graduação estão em expansão. "Temos muito mais recursos de investimento nessa área do que havia há 20 anos. E o setor ainda não se esgotou, está em crescimento", afirma. Quando sancionada, as universidades ainda terão três anos para a adequação da norma.

A mudança, na opinião de Alavarse, é positiva. "Essa exigência é essencial para o desenvolvimento das universidades. Mestres e doutores são pessoas que passaram por um processo de formação mais longo, voltado à pesquisa. Nesse sentido, a proposta é muito positiva. Universidades precisam da elaboração de projetos de pesquisa que pressupõe profissionais qualificados para orientá-los", afirma. Segundo ele, nas universidades públicas, o número de doutores geralmente chega a metade. As privadas, no seu entendimento, seriam as mais afetadas. Dados do Censo de 2010 mostram que existem 130 mil mestres e 98 mil doutores no país. Entre os doutores, 70% estão nas instituições públicas.

Consultor educacional da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), Celso Frauches concorda que, de imediato, algumas instituições seriam afetadas. "Das 195 universidades, acredito que umas 12 teriam dificuldade", estima. A tramitação do projeto que reajusta o percentual de mestres e doutores, para Fracuhes, deve ser entendida como uma sinalização para que as instituições busquem desde já recursos e se organizem para cumprir a nova meta.

Na análise de Frauches, o primeiro impacto da mudança seria no preço da mensalidade das instituições privadas. "O estoque de doutores, que são melhores remunerados, teria de aumentar. Com isso, o custo aumenta", ressalta. Outro impacto seria nas faculdades, que, embora não tenham a obrigação de investir em pesquisa, também são cobradas para que tenham um número mínimo de doutores. "O instrumento de avaliação das graduações do MEC leva em conta esse percentual. Não existe uma norma que prevê isso nem cobertura de profissionais qualificados para cobrir essa demanda", argumenta.

Financiamento
A sugestão do consultor é que o MEC reestruture o sistema de financiamento da educação. "Na universidade pública existe mais incentivo para que o professor se especialize, com bolsas integrais. Para o ensino privado, as opções são mais limitadas, o que as leva a contratar doutores que não tenham contrato de exclusividade ou que são aposentados", explica. Essa reformulação, segundo ele, deveria ajudar na distribuição dos profissionais. Levantamento realizado com dados do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) mostra que as regiões Sul e Sudeste abrigam 71% dos doutores em atividade. A região Norte é a mais carente, com apenas 4% dos doutores. Procurado, o Ministério da Educação não se manifestou em relação à reportagem.

A exigência de mais mestres e doutores, segundo o relator do projeto no Senado, João Vicente Claudino (PTB-PI), retoma a ideia inicial de Darcy Ribeiro. Segundo ele, desde que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996 foi aprovada, essa mudança estava prevista. "Já se previa um nível de qualidade e excelência na educação superior, válido tanto para as instituições públicas quanto para as privadas", esclarece.

Progressão na carreira
Foi aprovado ontem o decreto nº 7806, que regulamenta os critérios e procedimentos para a progressão dos servidores da carreira do magistério do ensino básico, técnico e tecnológico. O desenvolvimento na carreira ocorrerá mediante progressão funcional por titulação e desempenho acadêmico. A regulamentação esteve entre as prioridades do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif), sendo pauta de reuniões nos ministérios da Educação e do Planejamento (MPOG). A pasta ainda detalhará critérios e procedimentos para a avaliação de desempenho acadêmico dos servidores e cumprimento dos requisitos de capacitação e titulação.

GRASIELLE CASTRO

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